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Olafur Eliasson – In Real Life na Tate Modern

  • Foto do escritor: Raquel Pereira
    Raquel Pereira
  • 20 de fev. de 2020
  • 7 min de leitura

Atualizado: 3 de abr. de 2020

Em Novembro do ano passado, numa viagem a Londres, consegui ir à Tate Modern ver a tão antecipada exposição do Olafur Eliasson In Real Life, uma retrospectiva que marca o regresso do artista àquele museu depois do sucesso do The Weather Project de 2003-2004, que criou na Turbine Hall da Tate uma representação gigantesca do sol que atraiu mais de 2 milhões de visitantes (muitas lágrimas por não ter conseguido ver isto).

The Weather Project, 2003-2004



In Real Life reúne mais de 40 obras de Eliasson e leva-nos numa viagem pelo seu percurso artístico, com início nos anos 90, ainda na faculdade, e terminando na actualidade, integrando formatos tão díspares como instalações, esculturas, fotografias e pinturas de materiais tão distintos como musgo, água glacial derretida e neblina, ou metais leves e reflexivos. Todos os trabalhos, excepto um, nunca haviam sido expostos no Reino Unido.

A arte de Olafur Eliasson foca-se em três pontos fulcrais: a preocupação com a natureza (a questão da emergência climática é uma constante na sua obra), aprimorada durante o tempo que passou na Islândia, local ao qual tem uma forte ligação; a sua pesquisa em geometria, padrões de movimento e teoria das cores; e as suas investigações sobre a forma como percebemos, sentimos e nos moldamos ao que está à nossa volta. As obras patentes em In Real Life são um reflexo destas questões, estando a experiência do visitante e a sua interecção com as obras (uma metáfora para a nossa interacção com o mundo) no centro da exposição. Nesse sentido, esta é uma exposição provocativa, que desperta os nossos sentidos ao colocar-nos num jogo constante, seja com o espaço, com a luz, com os objectos ou os materiais, confrontando-nos com o inesperado e levando-nos a rever a nossa perspectiva sobre o que nos rodeia, sobre a forma como vemos o mundo e os outros que partilham o espaço e a experiência connosco.

Eliasson acredita no papel que um artista pode ter na mudança de perspectiva dos que contactam com obras de arte, e um dos seus objectivos é que o visitante acrescente significado às obras, ao trazer as suas associações e memórias para estas experiências, criando simultaneamente uma relação com as pessoas que nos rodeiam naquele momento e com as quais formamos uma comunidade temporária. Essa consciência aumentada de si e dos outros pode criar um novo sentido de responsabilidade que todos devemos levar para fora do museu.


Algumas das obras mais emblemáticas foram expostas isoladamente mas a maioria foi agrupada, criando oito núcleos expositivos: Model Room; Early Works; Kaleidoscopes; Glacial Works; Iceland; The Expanded Studio; Ice Watch; Architecture.


MODEL ROOM

“Model Room” era a primeira sala da exposição e nela podíamos ver uma vitrina com cerca de 450 modelos, protótipos e estudos geométricos de vários tamanhos e formatos que funcionam como registo do trabalho de Eliasson com sua equipa de estúdio e com o artista, matemático e arquitecto islandês Einar Thorsteinn (1942–2015). Entre 1996 e 2014, Thorsteinn e Eliasson colaboraram em vários projectos e pesquisaram as formas geométricas, simetrias e proporções que estruturam várias esculturas, instalações e pavilhões do artista. Os modelos são feitos de diferentes materiais, incluindo fios de cobre, papelão, fotocópias de papel, lego, madeira, espuma e bolas de borracha. Actualmente a Model Room encontra-se também no Moderna Museet de Estocolmo.

EARLY WORKS

Na sala seguinte começávamos então a ver finalmente as peças, nesta caso, algumas das primeiras obras de Eliasson que revelava já interesses que ainda hoje continuam a motivar sua obra.

Moss Wall de 1994 cobria toda a parede esquerda de um musgo verde pálido, um trabalho que surgiu na sequência das suas primeiras investigação sobre arquitectura e se esta poderia ser mais parecida com a natureza.

O centro da sala era ocupado pela Wavemachines de 1995, quatro longas calhas cheias de líquido amarelo, cada uma delas equipada com um pequeno motor que provocava pequenas ondas na água.

Algumas peças integravam diferentes tipos de luz para alterar a experiência do espaço e da arquitectura. Como acontece com muitos dos trabalhos de Eliasson dessa época, o mecanismo das obras é muito simples e nunca oculto ao visitante.

A água é um elemento muito utilizado enquanto material de trabalho por Eliasson, e Beauty de 1993 é um dos seus trabalhos mais intrigantes, simples e bonitos, apresentado isoladamente numa sala escura, pois só assim se conseguia vê-lo e apreciar o seu efeito: uma névoa fina composta por gotículas aquosas pulsava de uma mangueira perfurada colocada no tecto, o que criava um véu semitransparente através do qual podíamos ver um arco-íris, dependendo do ângulo de visão e da lâmpada que nos iluminava.


Beauty, 1993



Uma das obras que tenho que destacar nesta exposição, e que confesso, me ia causando um ataque de pânico, foi o Din Blinde Passager (Your Blind Passenger), uma instalação de 2010 que consiste num corredor de 39 metros de nevoeiro intenso. Os visitantes entravam numa ante-câmara, que após fechada de um dos lados, se abria do outro para dar então acesso a este corredor que não tinha mais do que um nevoeiro intenso e de um amarelo denso que não nos deixava ver em nosso redor a mais de 1,5m de distância.

Este nevoeiro torna impossível ver na totalidade o espaço em redor, limitando a nossa visão e consequentemente tirando-nos a noção do que nos rodeia, das pessoas, da largura ou do comprimento do espaço. Desta forma, ao retirar-nos um dos sentidos, leva a que os outros se tornem muito mais apurados, e joga com a presença do outro, que não vemos se não em relances quando se aproximam de nós, para logo desaparecerem, o que afecta também os nossos sentidos na sua relação com os que estão mais próximos.

Eu, claustrofóbica assumida, arrependi-me de ter entrado logo após ter tentado andar os primeiros metros, mas a minha tentativa de voltar atrás foi em vão, uma vez que a porta só abre por fora e este corredor é mesmo a única passagem após a nossa entrada. Após algumas (muitas) tentativas para respirar fundo, fui seguindo devagar e na verdade, quando nos começamos a habituar à realidade, os nossos outros sentidos começam a deixar-nos mais confortáveis e consegui chegar ao fim sem cair para o lado. Mas, o próprio nevoeiro vai mudando de cor (beije, azul, branco) o que faz com que quando os nossos olhos se vão habituando a determinada cor, somos novamente surpreendidos e temos que nos reabituar novamente. É um jogo constante!

(o nevoeiro é composto de um fluido solúvel em água, contendo polióis não tóxicos - um adoçante frequentemente usado na produção de alimentos).


Your Blinde Passanger, 2010



KALEIDOSCOPES

Eliasson fabrica caleidoscópios desde meados dos anos 90. Nesta sala, um trabalho mais antigo, Your spiral view de 2002 é apresentado em conjunto com um trabalho recente Your planetary window de 2019. Para o artista, o caleidoscópio oferece mais do que apenas uma experiência visual engraçada ou divertida mas é visto como uma forma de fracturar e reconfigurar o que se vê. Assim, temos diferentes perspectivas ao mesmo tempo e podemos entender a nossa posição de novas maneiras, podendo abandonar a sensação de estar em controlo do espaço à nossa volta e, em vez disso, desfrutar de um tipo de incerteza.


Your Spiral View, 2002

Um dos maiores sucessos da exposição, foi a peça Your Uncertain Shadow (Colour) de 2010, tão simples quanto uma sala branca onde não está mais nada a não ser cinco focos coloridos de luz direccionados à parede: uma luz verde ao lado de outra luz verde, seguida por uma luz magenta, uma luz laranja e, finalmente, uma luz azul. Essas cores combinam-se para iluminar a parede com uma luz branca brilhante. Quando o visitante entra no espaço, a sua sombra é projectada, bloqueando cada luz colorida de um ângulo ligeiramente diferente, o que faz com que seja reflectida na parede como uma matriz de cinco silhuetas de cores diferentes. À medida que os visitantes se movimentam pelo espaço, passando mais perto ou mais longe das luzes, as silhuetas mudam em intensidade e escala de cores.

A interactividade da peça leva os visitantes a criar verdadeiras performances naquela sala, o que pode criar horas de entretenimento para quem estiver interessado em simplesmente assistir aos outros.


Your Uncertain Shadow, 2010


GLACIAL WORKS

A utilização de gelo glacial nas suas obras está, em muitos casos, associado à luta contra as alterações climáticas. Nos últimos anos, a camada de gelo da Gronelândia terá perdido entre 200 a 300 mil milhões de toneladas de gelo glacial por ano, uma taxa que se espera que aumente drasticamente. Como resultado vários blocos de gelo desprendem-se dos glaciares, criando um aumento de icebergs que por sua vez irão causar o aumento do nível das águas do mar.

Um das obras mais impactantes da sua autoria foi a Ice Watch realizada em conjunto com Minik Rosing e apresentada em frente à Tate Modern em 2018 (já havia sido apresentada noutros locais). Esta é uma instalação de blocos de gelo encontrados nas águas da costa da Gronelândia, que permitem uma experiência directa e tangível da realidade do derretimento do gelo do Ártico. Quando instalados, cada bloco de gelo pesava entre 1,5 a 5 toneladas, porém durante a sua exposição, estes acabam por derreter, não deixando rasto. Pretendia-se assim um contacto directo com a realidade das alterações climáticas, uma vez que muitos de nós não conseguem ver os seus efeitos a não ser através de fotografias.

Ice Watch, 2018

Tate Modern


Outros trabalhos patentes nesta sala como funcionavam como uma referência mais abstracta às mudanças do meio ambiente, como o The presence of absence pavilion de 2019 .



ICELAND

Eliasson visitou a Islândia regularmente na sua infância, marcada por um contacto privilegiado com a natureza. Ao longo dos anos foi criando séries fotográficas que documentam o país e lhe permitiram testemunhar em primeira mão como as alterações climáticas estão a causar o derretimento dos glaciares. Um dos projectos apresentados nesta sala foram as série fotográficas dos glaciares realizadas em 1999, aos quais se juntou uma nova série feita em 2019, que demonstra as mudanças na paisagem.



THE EXPANDED STUDIO

O espaço final da exposição, The Expanded Studio, permite-nos conhecer um pouco mais sobre o trabalho que ele e os seus colaboradores realizam no seu estúdio em Berlim. Ali, Eliasson reúne uma equipa que integra profissionais de diversas áreas (arquitectos, designers, cozinheiros, engenheiros) e trabalha constantemente para além da sua prática artística mais conhecida em projectos que incluem, por exemplo, um livro de receitas ou projectos de danças. Muitos abordam directamente as questões que o mundo enfrenta actualmente, como as questões da energia renovável (Little Sun) ou da migração (Green light – An artistic workshop).


(Imagens: Raquel Pereira e https://www.olafureliasson.net/)

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